Cara, essa é uma discussão constante na atual relojoaria, sobretudo porque se tornou muito cara e as pessoas "esclarecidas" compram os produtos muitas vezes seduzidos por aquele "espectro" do passado, da coisa artesanal, o hand made por Leprechauns no fim do mundo.
Fato é que a indústria, sobretudo a Suíça, já havia deixado de fazer as coisas artesanalmente há mais de século. Se olharmos de forma bastante simplista a evolução da relojoaria mecânica, dos seus primórdios nos séculos XIV (relógios de campanário) e XV (relógios portáteis), veremos que inicialmente tudo era feito manualmente, por um relojoeiro (na época ferreiro), utilizando as ferramentas de outros ofícios (fabricação de fechaduras, etc). Basicamente usavam ferro e limas. Com a especialização foram surgindo os primeiros tornos, a produção pulverizou-se entre várias pessoas, ocorrendo divisão de trabalho.
Ora, a maior revolução na relojoaria ocorreu na parte de produção de máquinas, com pessoas do naipe de Frederic Ingold. E tais máquinas buscavam justamente suprimir o ser humano da equação em tarefas mais simples, mas também aumentando qualidade.
Olhando por esse lado, não vejo muita diferença entre um pantógrafo do século XIX e as atuais fresas CNC.
Na verdade, essa profusão de mecanismos complexos e, sobretudo, a possibilidade de testes com protótipos de forma mais simples só se tornou acessível a partir das fresas e tornos CNC.
É claro que, na produção, a "mão" humana acabe desaparecendo, mas ela sempre estará lá na montagem e, claro, projeto dos movimentos.
A comparação que faço com a indústria atual é mais ou menos a história do disco de vinil. Antigamente nós (pelo menos eu...) aguardávamos ansiosamente o lançamento de um álbum, porque não era barato produzir e divulgar um. A mídia mudou, passou para o CD, mas a coisa continuou a mesma.
Tudo se alterou com a facilidade de produção de discos por qualquer um dentro de casa, bastando ter um bom computador e programa de edição de áudio.
Hoje qualquer um lança músicas na net, mas para se sobressair, tem que suar. E as pessoas começaram a achar trivial ouvir centenas de músicas num MP3 o que, na minha opinião, tirou muito da graça da história. Explico.
Meu carro tem MP3, apesar de ser de 2006. Mas acredita que ainda ouço muito CD nele? É que quando pego um CD, aquele CD, é como se eu me preparasse para ouvir só aquilo. É um ritual.
Hoje, voltando ao assunto, qualquer pessoa com capacidade técnica e disposição adquire uma fresa CNC por cerca de uns 500 mil dólares, e consegue mandar brasa num relógio. Talvez por isso a profusão de fábricas totalmente obscuras que vemos hoje. São os produtores de música de fundo de quintal... Tem que se sobressair. E mesmo quando se sobressai, você começa a questionar. Pô, preferia saber que o cabra teve uma dificuldade maior em fazer isso, aí você se volta para uma relojoaria mais tradicional, começa a questionar valores e descarta determinadas fábricas. E separa seus "Cds", ou marcas que agregam valor mesmo, seja pela história, etc, para levar para casa.
Os métodos mudam, mas no fundo tudo ainda é "música", relojoaria mecânica, que seja feita com técnicas ultrapassadas ou do presente, continua me fascinando (muito embora nada de música atual me fascine!
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Flávio