Volto ao tópico, porque hoje o Swatch Group comunicou que seu lucro para o semestre irá cair entre 50 a 60%. Não há um zero a mais aí, os números são esses mesmos...
http://www.thelocal.ch/20160715/swatch-shares-plummet-after-drop-in-salesClaro que as ações despencaram...
E antes que digam que isso diz respeito apenas ao Swatch Group, o fato de as vendas do GRUPO terem caído diz muito sobre TODA indústria suíça, porque, para citar apenas um exemplo, a parte mais importante de um relógio, o escapamento, é o SG que detém praticamente o monopólio da sua fabricação. Sim, mesmo nas empresas ditas "manufaturas", podem ter certeza que balanço e espiral vem do SG.
Ontem li uma entrevista com o dono da Bayer, que é o maior revendedor suíço, e ele disse que os suíços são as pessoas no planeta que mais repetem os seus próprios erros.
E é verdade... Não precisa ser expert na história da relojoaria para ver que os suiços sempre aproveitaram momentos efêmeros de grandes vendas para extrair o máximo do mercado e, sem preocupar com o futuro, quebrar depois. Foi assim na crise de 1875, no pós primeira guerra, nos anos 70 e 80 e, parece, tudo caminha para nova crise. Os sinais estão aí e o que nós, de um simples fórum brasileiro de relojoaria, estamos falando há séculos, parece que eles não ouvem.
Os caras deveriam olhar para um consumidor como eu, que tinha por hábito comprar um relógio por ano, e agora não compra nenhum, e questionar: como perdemos esse consumidor que gastava uma boa grana com relógios? Mas não fazem isso...
No final das contas, os problemas são os mesmos. Se você vende um produto em sua natureza ultrapassado, deve "vender" ao consumidor uma ideia de que ele está comprando algo "mágico". Caso contrário, ele não teria interesse no bem.
Em síntese, o interesse em um relógio mecânico de luxo advém de:
1) A imagem de sucesso que este passa;
2) Valores intrínsecos culturais, o tal "heritage", tanto ressaltado pelas empresas;
3) A perpetuidade do bem para gerações futuras;
4) A beleza do acessório.
E no final das contas, isso só piorou na última década. Ora, quando comecei a mexer com relógios, você enviava um e mail para a Omega ou Longines e este era respondido pelo curador do museu, na mesma semana! "Contato humano", parte do heritage... Um relógio se vende porque VENDEM a imagem de que aquilo ali foi fabricado por "duentes encantados" numa fábrica encantada, o que não é verdade. Hoje, falta o contato humano, o que só pode ser encontrado em fábricas pequenas como, por exemplo, tive a oportunidade de ver (por exemplo, a Glashutte Original).
A imagem de sucesso do bem... Ora, atualmente a nova geração sequer usa relógios. Como conquistá-los? Nunca vi campanhas das empresas neste sentido, a não ser eventualmente, como a interessante jogada da Heuer de vender o seu smart watch e, depois, por um preço menor, colocar um mecanismo a corda lá dentro.
Perpetuidade dos bens futuros. Bah... Não sei se sabem, mas quando o Timex foi lançado, no inícios dos anos 60, os suíços chiaram. Vejam, esse troço não tem PERPETUIDADE, sua caixa é rebitada, sequer pode ser reparado! Tá... Mas como cada Timex da época custava uns 5 dólares e um Omega, como já viram em anúncios, cerca de 50, a Timex não estava nem aí, muito menos seus consumidores. Eles jogavam fora o relógio e compravam outro.
E hoje? Ora, eu tenho pelo menos uns 5 relógios que hoje, novos, custariam cerca de 10 mil reais simplesmente jogados em gavetas sem uso porque, após pouco mais de dez anos de uso, desvalorizaram-se a um ponto que a revisão deles em autorizada custa MAIS CARO DO QUE O PRÓPRIO RELÓGIO! Como convencer um comprador de um relógio de 10 mil reais que, ao levá-lo para revisão em dez anos, esta custará o preço do relógio? A indústria de carros NUNCA conseguiria vender seus automóveis se, no plano de revisões programadas de um carro como o meu, um Focus, que custa uns 90 mil, indicasse que a primeira iria custar, digamos, 45 mil reais... Perpetuidade? Que perpetuidade? Os relógios são descartáveis nas gamas "baixas", se é que posso assim dizer, de até dez mil reais...
A beleza do acessório é onde os suíços ainda se sobressaem, mas como estão conquistando, volto no tema, as novas gerações que sequer querem usar relógios?
Olha, eu ADORO a horometria, acho que nunca foi deixar de estudá-la, mas às vezes tenho vontade de que a indústria se foda de vez para deixar de ser besta...
Se eu tivesse a oportunidade de me encontrar com figurões da indústria, iria lhes dizer: venham cá, sentem aqui comigo que o titio vai lhes contar algumas verdades... Ouçam bem...
Flávio