Comprei o livro em 2013, logo após o falecimento de George Daniels, sendo que o esqueci na biblioteca até pega lo para ler há cerca de um mês.
O livro, escrito pelo próprio Daniels, conta sua história desde as suas primeiras lembranças, algo em torno de 4 anos de idade. Infância paupérrima em Londres, com pais completamente ausentes e abusivos. Mas percebemos aí que foi justamente esse tipo de criação (ou a falta dela...) que fez com que Daniels se tornasse uma pessoa individualista e disposta a conseguir o que queria de forma autodidata.
O livro também aborda a concepção de seus relógios e, sobretudo, o tormento que foi tentar convencer, durante quase 20 anos, alguma empresa a encampar o projeto e implementá-lo de forma industrial.
Finalmente, aborda também em profundidade o gosto de Daniels pelas corridas de automóveis antigos, sobretudo Bentleys, e a restauração de dezenas deles, algo que ele realizou pessoalmente e sozinho, como seus relógios.
A impressão que tive é que Daniels dedicou-se incansavelmente a atingir seu objetivo, ser reconhecido como um dos maiores relojoeiros de todos os tempos, trabalhando, dos 20 aos 85 anos de idade, entre 12 a 16 horas por dia, inclusive sábado, domingos e feriados (cada um dos relógios que construiu consumiu-lhe aproximadamente 4000 horas de trabalho ininterrupto. Somem a isso as dezenas de restaurações de automóveis e terão a dimensão da máquina de trabalho que era o homem).
Porém, e talvez justamente por isso, percebe-se que sua família tenha sido negligenciada, assim como ele próprio o foi na sua criação. Sabiam que ele foi casado? Pois é... Mas esse fato é contado em dois parágrafos no livro e, mesmo assim, com considerações a respeito do regime de bens deles (ela era riquíssima, ele não...). Sabiam que ele teve uma filha? Simplesmente isso não é sequer comentado no texto, apenas conclui-se em uma das fotografias...
A comparação com um dos meus ídolos, John Harrison, foi inevitável. Após o livro eu conclui que Daniels foi sim um gênio, um dos maiores relojoeiros de toda História, podendo ser colocado ao lado dos mais fodões no panteão, como Harrison, Mudge, Breguet, Arnold, etc. Mas para atingir o objetivo de ser um dos fodões, sua família parece ter sido jogada para escanteio. Sem contar que Daniels me pareceu ser uma pessoa ranheta e pão dura, apesar de conviver com as pessoas mais ricas da Inglaterra.
Enfim, curti muito o livro, vale muito a pena, a leitura é rápida e agradável, pelo menos até os 2/3 iniciais. A parte final, sobre os carros, é sim interessante, mas me parece "deslocada" na obra, não em conteúdo, mas em "local" na escrita.
Ps. Há um capítulo final adicionado post mortem pelo Roger Smith contando como se conheceram, etc, que também é um must.
Curti o livro, quem domina a língua e gostaria de conhecer o homem por trás dos relógios deve ler.
Flávio