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A fabricação de uma caixa Rolex e a evolução das máquinas

Iniciado por flávio, 25 Setembro 2020 às 15:55:13

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flávio

Há cerca de um mês eu publiquei um texto sobre a indústria americana e a revolução que esta causou, no sentido de implementar as "máquinas inteligentes para operários burros". A evolução das máquinas que fabricam os produtos, com efeito, é o que diferencia algo feito hoje e há 100 anos...

Dito isso, muito valorizamos o tal "fabricado artesanalmente", que em tese adiciona singularidade e valor agregado ao produto. Mas será mesmo que isso é tão importante assim? Deixo o pensamento para reflexão...

Eu revi agora, pois esse excerto faz parte de um vídeo maior que a Rolex publicou há uns dois anos, os processos de fabricação de suas caixas (que pouco diferem de fábricas monstruosas e praticamente automatizadas como, por exemplo, a a Omega). Prestem atenção no nível do "bizarro" da indústria atual de relógios: utilizam-se os mais modernos equipamentos, algo inacreditável até mesmo para aqueles que adoram ficção científica, para se construir um produto que é totalmente obsoleto em sua função...

O vídeo é auto explicativo e, é claro, somente uma empresa do tamanho da Rolex (e poucas outras, como a Omega), pode se dar ao luxo de ter prensas (sim, a caixa não é fresada, mas prensada) totalmente automatizadas para fazer as caixas e robôs para o polimento (o acabamento final, é possível ver rapidamente no vídeo, é feito manualmente...). A Rolex não esconde que seus produtos são feitos de forma quase totalmente automatizada, pelo contrário, enaltece isso como um sinônimo de precisão (o que é verdade, pois raros os processos nos quais um ser humano fará um trabalho melhor do que um robô, essa a realidade nua e crua...)

https://www.youtube.com/watch?v=9UuDJl93Z1g


João de Deus

Muito legal Flavio


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João

Devenalme Sousa

Impressionante o nível de automação. Esses robôs tão milimetricamente controlados dão até medo! Kkkkkk

Penso que esse excesso de padronização na feitura de relógios deveria refletir-se no preço final, mas não é o que ocorre no caso da Rolex, que tem preço de relógios produzidos de modo mais "artesanal".

A mim essa forma automática de produção não me incomoda, até porque eu não posso mesmo comprar um Rolex. Mas, se eu tivesse condições financeiras de comprar relógios nessa faixa de preço, optaria por algum relógio que contivesse em sua produção um pouco mais de exclusividade.

Desotti

Taí uma questão interessante para se analizar:

Automação de última geração numa indústria normal visa aumentar a eficiência e a produtividade sem perda de qualidade (ao contrário, como disse o Flávio robôs são mais precisos nas tarefas que podem executar), possibilitando em última instância aumentar a oferta de produtos a preços competitivos.

Como o "aumento" na quantidade ofertada de relógios  esportivos Rolex é inversamente proporcional ao seu aumento de preço, mesmo com toda a alta tecnologia de automação empregada em grande parte do seu processo de produção, não teríamos aí um paradoxo?  ???

FPiccinin

#4
Flávio. Só um detalhe.
Esse processo de fabricacao das caixas é forja a frio.
Por que forjar a frio e não usinar?
O processo de forja a frio aumenta a resistência mecânica da peça e é mais produtivo e barato.
Esse processo em aço é relativamente novo e o investimento é pesado. As ferramentas (matriz, punções) sao bem caros e não é para qualquer um.

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FPiccinin


FPiccinin

Citação de: Desotti online 25 Setembro 2020 às 23:13:31
Taí uma questão interessante para se analizar:

Automação de última geração numa indústria normal visa aumentar a eficiência e a produtividade sem perda de qualidade (ao contrário, como disse o Flávio robôs são mais precisos nas tarefas que podem executar), possibilitando em última instância aumentar a oferta de produtos a preços competitivos.

Como o "aumento" na quantidade ofertada de relógios  esportivos Rolex é inversamente proporcional ao seu aumento de preço, mesmo com toda a alta tecnologia de automação empregada em grande parte do seu processo de produção, não teríamos aí um paradoxo?  ???
Infelizmente é necessário ponderar que não ha mão de obra especializada para a indústria metalúrgica de precisão. A automação tb buscar mitigar esse risco.
Ou os caras automatizam ou em breve não haverá quem produzir.


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KBM



Citação de: Desotti online 25 Setembro 2020 às 23:13:31
Taí uma questão interessante para se analizar:

Automação de última geração numa indústria normal visa aumentar a eficiência e a produtividade sem perda de qualidade (ao contrário, como disse o Flávio robôs são mais precisos nas tarefas que podem executar), possibilitando em última instância aumentar a oferta de produtos a preços competitivos.

Como o "aumento" na quantidade ofertada de relógios  esportivos Rolex é inversamente proporcional ao seu aumento de preço, mesmo com toda a alta tecnologia de automação empregada em grande parte do seu processo de produção, não teríamos aí um paradoxo?  ???

Olá Desotti! Seu raciocínio seria perfeito, não estivéssemos falando de um artigo de luxo, em que a lógica colocada por você se subverte completamente. Na indústria de luxo, desejo e exclusividade fazem as vezes de oferta e competitividade de valores; e nenhum dos dois primeiros vai bem com redução de preços.

Quanto à automação e sua ponderação diante dos (absurdos) valores de mercado atuais, volto a um ponto debatido com amigos recentemente: para sermos justos, a Rolex nunca se pretendeu uma manufatura de alta relojoaria. Naquilo que faz - relógios de médio luxo esportivos - reina absoluta e, de fato, ninguém se compara à ela, no conjunto qualidade, apelo da marca e presença de mercado. A marca sempre se promoveu por valores como precisão e durabilidade, nunca alardeou complicações e acabamento manual sofisticado.

Os valores de tabela, em usd, são coerentes (dentro de um mercado de luxo) com o que a marca se propõe a entregar e, sinceramente, são competitivos na faixa de preço. Os valores de mercado atuais, algumas vezes vários múltiplos acima da tabela e que estão ainda piores no Brasil em razão do câmbio, realmente colocam a Rolex em faixas de preço que não fazem sentido para o produto. Mas isso não é culpa da Rolex.

Alguns dirão que ela é indiretamente responsável, pois cria uma escassez artificial que, por sua vez, infla os preços no mercado paralelo, mas a postura da marca em manter sua produção controlada e seguir firme na publicidade do seu produto, ao invés de inundar o mercado e seguir a sina de Richemonts, Swatch Groups e LVMHs da vida é exatamente o faz da Rolex, bem... a Rolex.

Desotti

Kauebm, em verdade fiz apenas um questionamento para a reflexão de todos, até porque eu não fazia ideia de que havia esse nível de automação na produção e acabamento de caixas dentro das grandes manufaturas.

Pelo que pude notar no vídeo a questão do acabamento manual deve ser mínima, ou talvez até se reservar a uma inspeção e correção manual de eventuais imperfeições deixadas pelos robôs e até então eu achava que automação era mais restrita a pequenos componentes, como as rodas de balanço de silício da Omega, por exemplo.

A questão do preço final é sempre ditada pelo que o mercado está disposto a pagar então não creio ser muito válido voltar nessa discussão, entretanto com tão elevado nível de automação acho difícil justificar a escassez de certas peças no caso da Rolex, então a meu ver isso ocorre para forçar o mercado cada vez mais para cima.


flávio

Aliás, falando em silício, o processo é um dos troços mais complexos existentes na indústria, envolvendo fotolitografia, plasma, etc. É um lance tão especializado, mas tão especializado e caro, que só as grandes fazem por conta própria. As demais terceirizam, em regra para uma empresa chamada Mimotec que, se não estou enganado, tinha participação societária da Ulysse Nardin. Eu não pesquisei se a Mimotec entrou no rolo quando a Kering adquiriu a UN, vale a pesquisa...

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Desotti

Aliás eu me expressei de maneira errada, eu quis dizer a espiral do balanço em silício, embora creio que a roda também deva ser do mesmo material.


flávio

#11
Sim. O processo é exatamente o mesmo. Sendo ULTRA simplista, envolve a impressão do desenho querido num disco de silício, a aplicação de "máscara" protetora no desenho, a exemplo do que um grafiteiro faz com fita adesiva quando cria um desenho numa parede e, finalmente, o uso de plasma na superfície, de modo a dissolver o que não estava "protegido", restando as peças fabricadas. É um troço MUUUUUUITTOOO complexo. A crítica dos puristas é que o negócio é tão distante da metalurgia, tem muito mais a ver com a fabricação de componentes eletrônicos, que se torna impossível de replicar pelo relojoeiro independente ou do futuro no caso de quebra. Eu acho essa crítica completamente sem sentido, porque não se contam em dezenas os relojoeiros no planeta capazes de fabricar componentes tão precisos e metálicos como os atuais... Ou você acham que se um relógio da Omega que vocês possuem, com espiral metálica e roda também metálica, se quebrar, terá esses componentes replicados por um relojoeiro? Não é impossível, MAS QUASE IMPOSSÍVEL um relojeiro fodão, e estou falando de cara fodão mesmo, como um Roger Smith, replicar uma espiral de balanço produzida em massa nos dias de hoje. Impossível. Ou seja, tanto faz se o componente de escapamento é feito em metal ou silício, ele nunca será replicado no caso de quebra por um relojoeiro, não só porque é DIFÍCIL pra caralho, exige ferramental específico, como seria economicamente inviável.

Minha crítica ao silício é outra, mas é a mesma crítica feita a toda indústria atual: utiliza-se a mais moderna técnica metalúrgica (ou de eletrônica) para se criar um produto que é intrinsecamente obsoleto na sua função. É como se uma pessoa pegasse um Ford T e, mantendo todas as suas características toscas do início do século XX, gastasse mundos e fundos para retirar seu carburador e nele instalar uma injeção eletrônica. Vejam, minha crítica não afasta minha paixão pelos mecanismos chamados relógios, eu só estou ressaltando a vida como ela é...

Em segundo lugar, não sabemos como esses componentes em silício irão se comportar no longo prazo. Escapamentos metálicos estão aí desde a época do relógio astronômico de Su Sung, há 700 anos. Lubrificados e bem cuidados, duram para sempre, basta ver a quantidade de relógios QUE NÓS MESMOS do FRM temos, alguns com décadas e décadas de fabricação, funcionando perfeitamente. E um escapamento Omega Coaxial em silício, quanto tempo esse troço irá durar sendo submetido a constantes impactos? Eu sei lá... Mas... E daí também se não durarem décadas e décadas, será mesmo que nossos filhos e os filhos dele terão algum interesse por relógios, sobretudo de corda? Quem sabe os nossos netos não olharão um Omega Coaxial num museu e perguntarão, como já vi garotos hoje perguntando sobre vídeo cassetes, vinis, fita cassetes, etc: "para que serve isso?"

Flávio