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Moritz Grossmann e o que define um relógio como "alemão"

Iniciado por admin, 27 Janeiro 2014 às 20:49:44

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flávio

Bem, além do relógio ter de ser fabricado da Alemanha, o que "define" um relógio como "alemão"? Quais são as características que numa rápida olhada, assim como períodos nas artes, como pintura, arquitetura, etc, define um item como pertencente a uma certa categoria?

Conforme narrado no meu texto sobre a história da relojoaria alemã ( http://relogiosmecanicos.com.br/curiosidades/no-coracao-da-relojoaria-alema/ ), Adolph Lange iniciou toda indústria em Glashutte com o patrocínio governamental, com o intuito de desenvolver uma região que, outrora próspera em virtude da mineração de prata, estava extremamente empobrecida.

Atualmente, quando pensamos em relojoaria alemã, o nome Lange nos vem imediatamente na cabeça, mas muito mais pela atual fábrica de patrão do que pelo homem. Pior. Temos a tendência de esquecer que Lange não foi sozinho para Glashutte e, também como narrado no meu texto, não produzia seus relógios completamente numa fábrica apenas. Assim como na Suíça, a divisão de trabalho entre especialistas sempre foi a tônica da indústria alemã.

Em Glashutte, os projetos de movimentos eram compartilhados entre todas as fábricas, como Union, Lange, Assman e Grossmann. O que tinham em comum? Número de série de ebauches, não da produção de cada marca (o que torna a classificação dos relógios alemães antigos diferente da Suíça, por exemplo, onde cada fábrica tem seu próprio número de série), e fabricação e projeto de apenas um construtor: Grossmann.

Mas poucos se lembram ou sequer sabem disso. Tendem a imaginar que, no passado, antes do ressurgimento da relojoaria alemã "moderna", os ebauches usados pela Lange eram próprios. Não eram...Tudo Grossmann.

E foi Grossmann que, ao evoluir seu ebauche básico, criou o que viria a ser definido como características de um relógio alemão.

- Platina 3/4 (ou 2/3, como queiram) com corte reto e meia lua para acomodação do balanço;
- Suporte do balanço de formato característico, como motivo também característico desenhado a mão;
- Regulador de precisão;
- Rubis apoiados em chatons de ouro, mas não qualquer chaton. Devem ser proeminentes (algo que, por exemplo, não tenho visto na indústria alemã...);
- Acabamento frosted em ouro ou "invertido" (prata na maior parte, dourado nas bordas);
- Cliquè com formato de "dedo", mola de tensão externa e retorno de tensão para a corda;
- Triplo raio de Sol na rochet.

Fotos dizem mais do que texto. A foto a seguir, que tirei agora do volume 4 do livro de Herbert Dittrich, mostra a evolução dos calibres de Grossmann do início dos anos de 1850 até sua conformação final, em meados de 1860. Observem como os calibres passaram de uma ponte grande superior na platina até chegarem na conformação final, que ficou caracterizada como característica de relógio alemão. O último modelo é um Lange, ebauche Grossmann, com aquele padrão invertido de cores que falei, ao invés do frosted em ouro (desloquem a página ao final ou abram a foto, que está em tamanho grande para ficar centralizada).



Observem agora nesta foto como três fabricantes diferentes (Lange, Union e Grossmann) usavam exatamente o MESMO ebauche Grossmann, alterando apenas o escapamento e, no caso do cronômetro de bolso Grossmann (modelo abaixo), o sistema de carga.



Está bem Flávio, e daí? E daí que já devem ter percebido que todas as fábricas alemãs possuem elementos de um "clássico" desenho alemão em seus relógios. Mas todos os elementos? Só lembrava do Marco Lang... A Lange, por exemplo, em que pese toda sua expertise, usa folheado a ródio em seus relógios, com "glashutte ribbing" (assim como a Nomos), algo que me remete aos suíços e suas "geneva bars". Desculpem-me, mas desconheço relógio antigo de Glashutte com tal acabamento... A Nomos flertou com o dourado padrão (não frosted) no início de sua produção e, depois, o abandonou.

Há uns dois anos soube que pretendiam reabrir uma fábrica (não A fábrica) com o nome Moritz Grossman em Glashutte. Pensei com meus botões, naquela eterna discussão que temos aqui sobre apropriação de nomes: que pelo menos sejam justos com a tradição (algo que, por exemplo, a British Masters esqueceu-se...).

Hoje entrei no site da nova Moritz Grossmann. Juro que fiquei feliz. Eles não apenas fizeram um calibre inspirado nas tradições alemãs, mas o primeiro calibre que já vi com TODAS (eh...Quase todas hahaha) as características alemãs!

Percam um tempo na página deles sobre o movimento que estão fabricando:

http://www.grossmann-uhren.com/en/home/top/collection/benu/the-movement/

Lembrem-se do que leram acima e, inclusive, comparem com os modelos das fotos que coloquei, da infância da relojoaria em Glashutte. Vou dar um desconto pela falta do padrão frosted, mas até pilar para suporte da platina superior tem. Parece um mini relógio de bolso antigo.

Depois aproveitem e naveguem pelo site completo.

Como disse, achei que mandaram MUITO bem. Apropriaram-se do nome mas aposto que Moritz Grossmann deve estar tranquilo, não se revirando no túmulo...


Flávio


rpaoliello

Flávio; só um negócio. Os relógios alemães também primam por este jeito de arcaico de engastar os rubis (com os três parafusos nos apíces de triângulo) ao invés de cravado nas pontes? Abraço. Renato

flávio

#2
Sim, mas não só. Nos relógios antigos de Glashutte, todos usavam chatons em ouro. A diferença entre o acabamento da Lange e Grossman, que compartilhavam o mesmo ébauche, estava nos parafusos para fixação dos chatons. Enquanto a Lange usava os parafusos encaixando nos chatons pela borda, não proeminentes, Grossman usava parafusos com a cabeça a mostra.

Veja:

Lange



Grossmann




O ebauche, como sempre, é o mesmo.


Como disse acima, quem faz relógio alemão de fato com cara de alemão hoje é o Marco Lang. Notem como ele usa um desenho de platina superior bastante semelhante à dos primórdios, com um corte para acomodar o balanço. No entanto, enquanto o calibre dele possui certa "ondulação" na linha da platina, os de Grossmann (tanto nesses da nova Grossmann quanto nos antigos) tinha um corte reto. Como disse, a única coisa que não ficou idêntica ao passado foi o glashutte ribbing nos novos Grossmann, que parece ser um acabamento ditado mais pela modernidade do que pelo passado.

Calibre do Marco Lang:

http://www.lang-und-heyne.de/downloads/caliber/CaliberI.jpg



Flávio

igorschutz

A Dornbluth também usa vários elementos característicos dos relógios alemães, mas acrescentando alguns signos de qualidade da relojoaria suíça.

Infelizmente, essa é a norma, pois o público médio só conhece os símbolos de qualidade da relojoaria suíça, e esses caras pequenos não querem ou não podem gastar em marketing para educar os consumidores.
Opinião é como bunda: todos têm a sua. Você dá se quiser.
Opinião é como bunda: você dá a sua e eu meto o pau.

NÃO ACREDITE NO QUE 'FALAM' AQUI, ESTUDE BEM E TIRE SUAS PRÓPRIAS CONCLUSÕES

igorschutz

Opinião é como bunda: todos têm a sua. Você dá se quiser.
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NÃO ACREDITE NO QUE 'FALAM' AQUI, ESTUDE BEM E TIRE SUAS PRÓPRIAS CONCLUSÕES

Alberto Ferreira

Bela aula e excelente foco para ser observado por quem gosta de relógios além das "meras" marcas (colocado entre aspas apenas para enfatizar e não para criticar, é claro).

A história, a evolução, a construção e a mecânica, os porquês.

Grato, Flavio!

Alberto

rpaoliello


ogum777


flávio

Uma foto divulgada hoje dos belíssimos relógios feitos pelo Marco Lang em Dresden. Sim, ele segue todo padrão alemão. Hoje, infelizmente, se a pessoa quer relógio com muita, mas muita cara de alemão, só nos independentes...  :P




Flávio

flávio

Desenterrei o tópico porque a nova Moritz Grossman está com site também novo.

http://www.grossmann-uhren.com/?lang=en


Flávio

pedrobsb

Flavio, tomei a liberdade de comentar nesse topico para "upar" ele, pois é uma AULA muito interessante, assim como seu texto sobre os relogios alemães citado no inicio do topico e disposto no site-mãe.
Abraço

Pedro

flávio

Mais uma desenterrada, pois publicaram uma visita à fábrica no TZ

http://forums.timezone.com/index.php?t=tree&goto=7296213&rid=12189#msg_7296213

Caras, esses relógios são bonitos demais, muito bonitos e, na minha singela opinião, com um visual mais "alemão" do que o que hoje é o padrão, entenda-se, Langes e GO.


Flávio

AlexandreMed

flavio
vc ta de ferias eh???
pense num mouse nervoso..  nos q agradecemos!!!
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Adriano

Cara, eu desconfio que os Grossman sejam os relógios mais bem acabados (e na minha opinião, mais incríveis) que existem hoje, feitos por "fábricas", ou seja, descontando-se os dos relojoeiros independentes. É um nível que não consigo pensar em outro fabricante que se equipare.

Um Atum, em ouro rosa ou branco, ou o próprio de aço (cuja "simplicidade" do acabamento é tão magnífica quanto à dos modelos em ouro, e de quebra são mais exclusivos ainda por serem limitados).

Uma bagaça dessa é para fechar qualquer coleção...

Abraços!

Adriano


Rafael_DF

Que tópico!!!
Sensacional, parabêns a todos pelas postagens.

edson rangel

FIQUEM  TODOS NA PAZ DE DEUS !!!!

flávio

#16
Aliás, voltando ao tema, resolvi postar duas fotos de calibres IDÊNTICOS, mas com acabamento diferente, que ressaltam algumas coisas.

A Union, durante um tempo, foi empresa "irmã" da Glashutte Original (no seu retorno, mas antes de passar a integrar o Swatch Group). Na época, usava os MESMOS calibres da GO, mas oferecia os seus relógios pela metade do preço. Faltavam aos calibres o acabamento detalhista de um GO, mas no final das contas, eram os mesmos calibres... Imaginem, então, quando comecei a mexer com esse lance de relógios, um GO Panomatic custando cerca de 10 mil dólares e um Union, com mesmo movimento, mas com pior acabamento, custando algo em torno de... 5 mil. Vejam, 5 mil hoje não se compra nem Rolex que, conquanto seja um relógio EXCELENTE, é produzido ao milhares sem praticamente contato humano algum. Na GO e Union é tudo praticamente artesanal... É claro que quando a Union passou a integrar o Swatch Group, esse estado de coisas não podia continuar, pois seria difícil explicar ao consumidor que marcas oferecendo praticamente a mesma coisa tivessem preços tão diferentes. Fato é que a o Swatch Group "implodiu" a Union e a colocou como entry level alemã. Hoje seus modelos custam no máximo 3000 dólares, e usam ETAs... Se querem um bom relógio alemão, a preços ridículos (mais sobre isso depois), procurem um Union da década de 90, início dos anos 2000.

Pois bem... As fotos a seguir mostram dois calibres IDÊNTICOS, mas com acabamentos diferentes. Esses calibres (calibre 40) são verdadeiras peças de museu herdadas da GUB e fabricados pela Glashutte Original depois tanto para seus relógios quanto Union.

Tudo do DNA alemão está aí: ponte 3/4, rubis apoiados em Chatons, regulador de precisão, a mola em formato de "dedo" para trava do tambor (mola cliqué), etc. Mas vejam como um possui um visual claramente ALEMÃO, por um detalhe que o outro não tem: o acabamento dourado e assinatura cursiva na platina. Comparem-no com os movimentos clássicos da Lange e Grossman do passado... É um clone de um relógio de bolso colocado no pulso!

Agora olhem o outro. O movimento é o mesmo, idêntico, mas teve adicionado um logotipo mais "moderno" e o acabamento decorativo de "glashutte ribbing", que nada mais é do que uma cópia do "geneva bars". Eu - e posso estar errado - desconheço que alemães tenham usado esse acabamento no passado. Isso sempre foi coisa de suíço.

Em resumo, vocês podem achar o prateado com listras mais bonito, mas certamente não é o tradicional... A impressão que tenho é que a Lange, no seu retorno, para bater de frente com Patek e passar ao consumidor a impressão de que eles estariam comprando algo igual ou superior ao suíço, adotou esse acabamento.

Particularmente, gostaria de ver o retorno ao acabamento dourado na indústria alemã, com escovado na platina (frosted).


Vejam:









Flávio


Ps. Sobre os preços dos Unions dessa época:


Você compra hoje um Union com calendário perpétuo (e lembrem-se que o calendário perpétuo mais barato do mercado, em aço, custa o dobro disso...), em ouro, por menos de dez mil. Duvidam?

http://www.chrono24.com/en/unionglashuette/johannes-duerrstein-2-rose-gold-perpetual-calendar--id4325519.htm

Marcos David

Excelente!  :D :o

Parabéns pelo post e pela continuação...  :D
"O mundo intriga-me. Não posso imaginar que este relógio exista e não haja relojoeiro." ― William Paley