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Corda no relógio.

Iniciado por Filipeandrade, 16 Maio 2012 às 13:03:43

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Filipeandrade

Bem amigos, guardei um pequeno texto há tempos...

Lembrei dele na discussão de como dar corda aos relógios... Mais nunca achava ele aqui nas mais de mil gavetas do meu disco rígido.

Mais finalmente depois de revirar algumas velharias cibernéticas guardadas com muito carinho, venho a apresentar esse pequeno texto.
(não sei a autoria)




Pense nisto:

Quando dão a você de presente um relógio estão dando um pequeno inferno enfeitado, uma corrente de rosas, um calabouço de ar. Não dão somente o relógio, muitas felicidades e esperamos que dure porque é de boa marca, suíço com âncora de rubis; não dão de presente somente esse miúdo quebra-pedras que  você atará ao pulso e levará a passear.

Dão a você — eles não sabem, o  terrível é que não sabem — dão a você um novo pedaço frágil e precário de você mesmo, algo que lhe pertence mas não é seu corpo, que deve ser atado a seu corpo com sua correia como um bracinho desesperado pendurado a seu pulso. Dão a necessidade de dar corda todos os dias, a obrigação de dar-lhe corda para que continue sendo um relógio; dão a obsessão de olhar a hora certa nas vitrines das joalherias, na notícia do rádio, no serviço telefônico. Dão o medo de perdê-lo, de que seja roubado, de que possa cair no chão e se quebrar. Dão sua marca e a certeza de que é uma marca melhor do que as outras, dão o costume de comparar seu relógio aos outros relógios. Não dão um relógio, o presente é você, é a você que oferecem para o aniversário do relógio.

Instruções para dar corda no relógio

Lá no fundo está a morte, mas não tenha medo. Segure o relógio com uma mão, pegue com dois dedos o pino da corda, puxe-o suavemente. Agora se abre outro prazo, as árvores soltam suas folhas, os barcos correm regata, o tempo como um leque vai se enchendo de si mesmo e dele brotam o ar, as brisas da terra, a sombra de uma mulher, o perfume do pão.

Que mais quer, que mais quer? Amarre-o depressa a seu pulso, deixe-o bater em liberdade, imite-o anelante. O medo enferruja as âncoras, cada coisa que pôde ser alcançada e foi esquecida começa a corroer as veias do relógio, gangrenando o frio sangue de seus pequenos rubis. E lá no fundo está a morte se não corremos, e chegamos antes e compreendemos que já não tem importância.



Por isso, cada vez mais gosto de relógio, principalmente aqueles velhinhos que tem muita historia para contar ou imaginar, alguns relógios nos faz viajar para aqueles tempos da velha guarda. Principalmente quando ouço aquela ancora batendo na roda de escape e no fundo alguma musica do Noel Rosa ou Adoriran Barbosa, a mente vai longe...


Abraços amigos!

Filipe

Doce é a vida do operário que se basta a si próprio;
  Vivendo assim, encontraras um tesouro!

edulpj

Poético!!!

Os relógios como todos os artefatos que AUMENTAM o poder de um homem, tornam-se objetos de desejo. Uma simples bicicleta, já foi um objeto de poder, quando ninguém tinha carro nem motos e a magrela permitia que um homem se deslocasse mais rápido que seu semelhante a pé.

Assim foi com os carros... Os aviões... Os telefones celulares... Até mesmo um barbeador segurança, deu mais poder a seu dono do que as velhas navalhas...

Os objetos mais geniais entretanto, são aqueles que tornam seu dono poderoso sem cobrar caro demais por isso. Um relógio a corda por exemplo...

vinniearques

Puts muito bom, adorei e já salvei tambem!