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Revisão e lubrificação nos mecânicos

Iniciado por O Cara, 30 Abril 2009 às 00:37:40

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O Cara

A nível de conhecimento geral, gostaria de saber o passo a passo de uma revisão e lubrificação num mecânico.
O que deve ser observado, quais os pontos de lubrificação, quais os tipos de óleos existentes e quais as quantidades, etc, etc, etc.

Mesmo não pretendendo fazer esse tipo de serviço por mim mesmo quero ter o conhecimento (nem que seja teórico) inclusive para poder conversar de igual para igual com os relojoeiros.

Já li essas informações aqui no fórum, mas nunca as vi juntas num único tópico, minha idéia aqui é de criar um passo a passo mesmo, para aumentarmos nosso conhecimento.
Um abraço
Fábio

igorschutz

Fábio,

Olha, se quiser ver uma revisão passo a passo de alguns movimentos, tente este link: http://www.eta.ch (que foi objeto deste tópico)
Escolha a língua de sua preferência. Se for inglês, vá na opção "Training Center" e escolha "ETA Swissl@b".
Ali, você poderá ver a desmontagem, montagem e lubrificação de cinco movimentos diferentes, entre automáticos, a corda manual, cronógrafo, quartzo e autoquartz.

Mais passo a passo que isso, impossível.

No entanto, para ter todas essas informações que você quer, de forma consolidada, só mesmo adquirindo livros ou lendo cursos completos na internet.
Lembre-se que um relojoeiro [decente] é um técnico altamente especializado, com anos de experiência e prática. É difícil querer conversar de igual para igual com uma pessoa assim se você só tiver conhecimento teórico.
Já estou nessa de relógios há quase 10 anos e não me sinto capacitado para conversar de igual para igual com um relojoeiro sobre esta parte de revisão.

O segredo é ter muita paciência e ler bastante, ou então aprender na prática. Só em um tópico é complicado ensinar o ofício.

Abraços,

Igor
Opinião é como bunda: todos têm a sua. Você dá se quiser.
Opinião é como bunda: você dá a sua e eu meto o pau.

NÃO ACREDITE NO QUE 'FALAM' AQUI, ESTUDE BEM E TIRE SUAS PRÓPRIAS CONCLUSÕES

O Cara

Bom dia Igor,
obrigado pelo link.

Quanto a aprender o ofício em um tópico, não era essa minha intenção, longe disso, só quero mesmo aumentar meu conhecimento.

E quando falei em conversar de igual para igual com um técnico relojoeiro, não foi para discutir o trabalho dele nem tentar me "mostrar", é mais para não ficar boiando quando ele falar termos técnicos (e dependendo do profissional, para eu não ser enganado).

Minha pretensão com este tópico é mais para adiquirir algum conhecimento nessa parte, nem sei quais são os pontos de lubrificação de um relógio, qual a quantidade de óleo que deve ser empregada, que tipo de óleo usar etc, já li muita coisa aqui no fórum, mas tudo salteado (inclusive sobre óleos).
A idéia seria juntar todo esse assunto afim num só lugar, aqui.
Um abraço
Fábio

Adriano

#3
Tentar explicar tudo em detalhes, é praticamente dar um curso de relojoaria de manutenção de uma vez só. Não é possível, por isso vou tentar condensar alguns pontos que considero importantes (aproveitando um raro momento para esfriar a cabeça).

A primeira coisa a se fazer ao receber um relógio mecânico para manutenção é verificar seu "gráfico" em um aparelho como um Witschi. Claro, isso se o relógio estiver funcionando, bem ou mal. Isso porque já há como se ter um diagnóstico básico das condições de lubrificação, condição da corda, e outras coisas. Já pode-se prever, utilizando a experiência, o que virá pela frente. É como um médico, que escuta seu pulmão e coração mesmo se você fôr no consultório para ver uma unha encravada...

Por exemplo, um cliente pode se queixar que seu relógio atrasa, ou adianta demais. Isso pode acontecer com um relógio novo ou recém-revisado. Não faz sentido já sair desmontando tudo para revisão. Ao se testar no aparelho, pode-se descobrir que o mecanismo básico está perfeito, com absoluta precisão, e que o motivo da marcha irregular é uma deficiência de carregamento da corda. Ou seja, o relógio está ótimo de precisão, mas como o automático não carrega a corda, ele fica funcionando por horas com pouca corda, e aí não há mágica que faça o bicho ter precisão. Num caso como esse, pode-se ir direto na fonte, mexer só no sistema do automático, sem interferir no resto que está perfeito, evitando intervenções desnecessárias.

Caso o relógio não esteja funcionando, de nenhum jeito, aí tem que já se partir para o primeiro passo da desmontagem, que é retirar o mecanismo da caixa e com lupa faz-se um exame. Nesse exame, o primeiro passo normalmente é dar um oque no balanço e ver se ele gira livremente. Com isso, já pode-se descobrir se o balanço ou o escapamento estão travados, e já se desconfiar de um eixo quebrado ou algo assim, ou se descobrir se o escapamento está ok, mas a força da corda nem sequer chega nele. Nesse caso, pode ser um defeito da rodagem ou simplesmente uma quantidade absurda de sujeira.

Feito isso, parte-se para desmontagem e lavagem. Não é comum inspecionar tudo antes da lavagem pois a sujeira encobre defeitos como um rubi partido, um eixo com "pescoço", e outras coisas. Um máquina especial utiliza-se de vários banhos e ultrassom para lavagem das peças, que são colocadas em uma pequena cesta de metal. Tudo é desmontado e peças muito pequenas como dispositivos anti-choque e contra-pedras são colocadas em uma cestinha especial, com trama bem fechada, para evitar que se percam. O balanço é lavado também, mas deve permanecer montado em sua ponte, e sua ponte montada na platina. Esse é o regulamento dos fabricantes, como Omega, por exemplo. A ordem de banhos da lavagem é: solução de limpeza, álcool isopropílico e benzina.
Detalhe: antes da lavagem, pode-se e deve-se recorrer ao velho e bom palitinho de dentes! Para limpar os orifícios dos rubis.
Caso haja sinais de ferrugem, em peças como uma platina ou ponte, a sujeira deve ser eliminada com um pincel de fibra de vidro, que funciona como uma escova.

Depois de tudo lavado, inspeciona-se os eixos das rodas, e aí cabe a experiência do relojoeiro com um determinado calibre para ir mais fundo nos pontos comuns de desgaste. Caso seja detectado, a substituição da peça poderá ser necessária. Essa avaliação depende também do nível de desgaste, do ponto onde há o desgaste, e por aí vai. Existem rodas em que um pequeno desgaste é tolerável, e outras em que não há tolerância nenhuma para desgaste.

Aí procede-se a montagem. Algumas coisas precisam ser lubrificadas antes da montagem. Por exemplo, o tambor de corda de um automático deve receber a graxa brecante em sua parede. Normalmente, a Kluber P125. Monta-se a corda dentro do tambor com ajuda de uma ferramente chamada estrapada. Lubrifica-se o mancal do tambor com óleo grosso, como um Moebius D5 ou HP 1300 e monta-se a árvore (eixo do tambor). Fecha-se o tambor e lubrifica-se o mancal ou rubi da platina onde apoia-se a árvore. Normalmente, em mancais ou rubis com parede do orificio espessa, lubrifica-se diretamente a parede antes de montar a peça, ao invés do convencional que se faz com as rodas, que é lubrificar com elas já montadas. É necessário fazer isso também com rodas de centro.

Então faz-se isso, e procede-se a montagem de toda a rodagem e suas pontes. Tudo montado, verifica-se de está tudo girando bem livre, e monta-se a âncora. Dá-se cerca de uma volta de corda no tambor para ele criar tensão na rodagem. Lubrifica-se a âncora com graxa especial, que se liquefaz sob impacto. O correto e ensinado por fabricantes é lubrificar a levée com a âncora montada. Pois se lubrificar antes, não há bom espalhamento do lubrificante entre os dentes da roda de escape e fatalmente "mela-se" lugares errados dos dentes ao montar uma âncora já lubrificada. Lubrificar ela montada é consideravelmente mais difícil. Faz-se isso através dos orifícios de inspeção das levées que há na platina. Coloca-se lubrificante somente na face de impulso. Se "borrar", tire a âncora e comece tudo denovo. Então coloca-se uma pequena quantidade e com cuidado avança-se alguns dentes da roda de escape, tocando a âncora para lá e para cá. Ela fará isso sozinha, pois antes foi dada uma volta de corda. Faz-se o mesmo com a outra levée. E pode-se repetir mais uma vez com cada levée. Em alguns casos, com âncoras muito esbeltas, lubrifica-se somente a levée de saída para evitar que lubrificante borre o corpo da âncora.

Feito isso, monta-se os antichoques, já com suas contra-pedras devidamente lubrificadas (com uma gota de óleo fino 9010 que deve ter diâmetro entre 1/3 e 2/3 do diâmetro da pedra). Lubrifica-se então todos os rubis das rodas. Óleo grosso como D-5 em roda intermediaria (quando há, ou seja, quando não há roda de centro), e em terceira roda. Óleo médio ou fino dependendo do caso na quarta roda. Óleo fino da roda de escape. Ou seja, com tudo montado, lubrifica-se os rubis que apóiam os eixos dessas rodas. A quantidade depende muito da experiência pessoal, estado de desgaste e outros fatores. Mas o geral é colocar o óleo no recesso no rubi, não ultrapassando metade de seu enchimento. Isso será quantidade suficiente para fazer o óleo penetrar no orifício, entre o pivô, e na parte inferior do rubi, formando uma pequena rodela de óleo onde apoia-se o ombro do eixo.

Aí, monta-se o balanço. O relógio já deve começar a funcionar. Aí pode-se já dar corda no tambor e colocar para funcionar. E prossegue-se na montagem no lado oposto da máquina, ou seja, o lado debaixo do mostrador. Aí vai o sistema de ajuste das horas, com o pinhão coulant, revoirs, tirete, mola do tirete, báscula e etc. Quase tudo é lubrificado com óleo grosso ou graxa leve, dependendo do mecanismo. Vai lubrificação no vinco do coulant, onde a báscula se apóia em cima; vai no engate entre o tirere e sua mola, vai no ponto de contato entre a mola e a báscula. Usa-se praticamente só óleo grosso nos revoirs, roda de minutos e roda de calendário. Usa-se graxa na chaussé. Monta-se o disco de calendário e seus arremates.

Tudo ok nesse lado, volta-se par ao outro lado para concluir o sistema do automático. Em muitos casos ele é como um módulo e pode ser revisado separadamente e montado no final. Aí, como são muitos sistemas diferentes, a lubrificação varia muito. Mas é comum ficar entre óleos grossos e médios. No caso de rodas reversoras, usa-se "epilame", que é uma película bem fina de lubrificante, aplicada por banho. Normalmente é o procedimento mais eficiente nos sistemas da ETA, por exemplo (2824, 2892...).

Aí parte-se para a regulagem, ainda sem montar o relógio na caixa. Uma vez regulado, receberá o mostrador e ponteiros. Monta-se na caixa e antes de fechar definitivamente, verifica-se denovo toda a regulagem.

E aí está pronto. É mais ou menos isso.

Abraços!

Adriano


Alberto Ferreira

Salve!

Fábio,
Se o amigo aceita um "conselho",...

Quanto ao relacionamento com o técnico, o esclarecimento de dúvidas básicas, o que será feito, etc.

Pergunte!
Se o tal técnico apenas "enrolar" ou não responder nada, mude de técnico.

Mas,...
Se me permite, eu faço uma ressalva.
A função de um bom técnico é fazer o seu trabalho (no relógio).
E ele "cobra" pelos seus conhecimentos e tempo empregado (muito valioso para ele).

Portanto, nós não podemos esquecer disso e pretender "alugar" o profissional como professor, não é a sua função precípua, mesmo (e principalmente) os que são mais atenciosos e até gostam de falar sobre a sua arte.

Um grande abraço!

igorschutz

Bela aula Adriano!
O difícil é digerir tanta informação...

Abraços,

Igor
Opinião é como bunda: todos têm a sua. Você dá se quiser.
Opinião é como bunda: você dá a sua e eu meto o pau.

NÃO ACREDITE NO QUE 'FALAM' AQUI, ESTUDE BEM E TIRE SUAS PRÓPRIAS CONCLUSÕES

Alberto Ferreira

Salve!

E com "conhecimento de cátedra".

Valeu, amigo Adriano!
Abraços!
8)

Adriano

Ah! Uns detalhes;

A lubrificação da parte do mecanismo de ajuste das horas é bastante intuitiva. As peças movem-se com muita força umas sobre as outras e basicamente onde há contato, assim, vai lubrificação.

Outra coisa: o bom relojoeiro sabe bem o que deve lubrificar. Mas o relojoeiro melhor ainda conhece bem o lado oposto da moeda, que é saber o que nunca se deve lubrificar, por mais raros que sejam esses casos.

Abraços!

Adriano

Lourival

Citação de: Adriano online 30 Abril 2009 às 11:35:25
Mas o relojoeiro melhor ainda conhece bem o lado oposto da moeda, que é saber o que nunca se deve lubrificar, por mais raros que sejam esses casos.
Adriano, um destes lugares é o pivot da âncora?
Já li em algum canto que nunca se lubrifica pivot de âncora ???. Esse troço tem sentido?

Adriano

Não, esse não é o caso. Deve-se seguir a orientação do fabricante, por meio dos manuais técnicos. Na maioria dos casos, não se lubrifica o pivô da âncora. E caso não se tenha um manual, deve-se adotar isso como regra. Porém, há fabricantes que o recomendam, como a Seiko e a Rolex. Ambas, contudo, possuem uma semelhança: eixos de âncora que parecem pregos! Ao contrário de muitos outros cujos pivôs são quase invisíveis a olho nú. Logo, entra aí a relação entre redução de atrito e geração de resistência, pelo lubrificante. Em pivôs muito finos, o atrito é muito pequeno e o lubrificante gera mais resistência do que redução de atrito. Em pivôs mais generosos, como é facilmente notado nos Seiko e Rolex, permenece a matemática tradicional do regime elasto-hidrodinâmico (vide minha matéria da revista Pulso nº58), e aí, lubrifica-se.

Abraços!

Adriano

O Cara

 :o  :o  :o  :o  :o  :o  :o  :o  :o  :o  :o  :o  :o

Adriano, que aula, muitíssimo obrigado.
Confesso que quando abri esse tópico esperava algumas opiniões, mas não uma aula completa como a sua, matou a pau !!!.

Igor, obrigado pelos links, foram muito elucidativos. Vi todas as animações, algumas vezes voltando para observar um detalhe ou outro, reparei o porque de usar 5 tipos de óleos diferentes (só não sei ainda quais são grossos, quais são finos e quais são graxa) mas já valeu.

Ainda existem alguns termos técnicos que passaram batido na minha cabeça, mas lembro de já tê-los visto aqui antes, depois com mais calma vou usar a busca do fórum para procurar algumas respostas.

Muitíssimo obrigado à todos que contribuíram.
Um abraço
Fábio

FALCO

Igor + Adriano  :o

Contribuições inestimáveis, como sempre...
FRM: contra argumentos, não há fatos !!!

paulorocha

E depois tem gente que não entende o porque de eu querer homenagear estes caras...

AULA ESPETACULAR!!!

Mais uma vez tenho a oportunidade de agregar informações valiosas ao meu ainda limitado conhecimento.

Valeu Adriano! Valeu Igor!

VALEU MESTRES!




Um grande abraço
Um grande abraço

Paulo Rocha

Mauro

Caros Amigos,

Adriano parabéns bela explicação, e por todos que ajudaram na aula.

Vai aqui uma ressalva aos relojoeiros e apredizes de plantão,

Eu sujiro que o incabloc seja a primeira parte a ser lubrificada e conferida, porque?

Com ele no lugar você pode ver o espiral ou cabelo, conseguindo ver o seu plano de uma maneira limpa , sem nenhuma roda ou ponte que tire um pouco a visão,

E fica mais fácil para você fazer a regulagem do espiral, tanto em seu plano como na parte de regulagem dos pitons, e tanto para deixar bem centralizado na ponte do balanço,

Acho que era isso,

Espero ter ajudado,

Abs,

Mauro

zE_

Igor, valeu pelo link.

Adriano e Mauro, obrigado pela aula!!


ryk@oticasfuji.com.br

Boa noite, sou novo aqui, e gostaria de pedir uma dica:
Fiz Revisao geral num orient masculino e feminino e ambos apresentaram comportamento diferente ao testá-los no vibrograph quando mudo a posição, ou seja qdo deixo deitado em posição horizontal ele atrasa e quando coloco na posição vertical, ou seja, simulando posição no pulso, ele adianta. Como posso resolver esse problema?

ryk@oticasfuji.com.br

boa noite, alguem sabe me dizer pq a maquina de um automatico apresenta comportamento diferente (adianta /atrasa), quando mudamos a posição da maquina ao estar passando a maquina pelo vibrograph? E se existe algum diagrama de lubrificação para relógios orient masculino e feminino?

flávio

Se fala em erros posicionais, basta pensar na concepção do balanço e sua espiral: os pontos de atrito e centro de gravidade se alteram ao se mudar a posição. Num dos primeiros textos que escrevi, há vinte anos, abordo o tema rapidamente

https://relogiosmecanicos.com.br/curiosidades/o-turbilhao-um-mecanismo-complexo/


Sobre a média no vibrograph dar uma e no pulso outra... Well... O delta calculado é uma média, ou seja, pega-se todos os adiantamentos e atrasos nas diversas posições e calcula-se subtraindo. Mas nada garante que o SEU pulso irá se movimentar nessa média. Sobre isso, um longo tópico

http://forum.relogiosmecanicos.com.br/index.php/topic,5251.msg255663.html#msg255663

ryk@oticasfuji.com.br

Ok, muito obrigado pela explicação!! Alguém sabe se tem algum material explicando a maneira correta de lubrificar orient e seiko masculino e feminino?