Finalmente, depois de muita especulação, a Zenith lançou seu revolucionário sistema de "escapamento" totalmente baseado em silício. Os relógios, apenas 10, foram inicialmente produzidos em série limitada, muito mais protótipos para demonstrar "savoir faire" do que qualquer outra coisa. Sabem aqueles Royal Oak com caixas estranhas que a Audemars usa para lançar alguma novidade tecnológica? Pois seguem a mesma veia, são relógios feios, mas construídos para "demonstração". Depois, acredito, surgirão modelos "normais" com as tecnologias.
Esse relógio é muito louco, não posso negar, e precisarão de um pouco de imaginação para entender o princípio do funcionamento que lembra o do Girard Perregaux Constant Force.
Inicialmente, devem se lembrar que o mecanismo que marca o tempo num relógio convencional é o balanço, que gira para lá e para cá em uma frequência constante. E tudo que possui uma frequência constante, até mesmo nosso coração batendo, pode ser usado com um relógio. Para "contar" as vibrações do balanço e transmiti-la para os ponteiros como algo visível, existe o escapamento, que à medida que o balanço vai para lá e para cá, bloqueia e libera todas as engrenagens, que estão sob tensão da corda principal. E à medida que ocorre esse bloqueio e desbloqueio das engrenagens, o ponteiro avança no mostrador (por isso o movimento contínuo de um ponteiro de relógio de pulso mecânico é apenas uma ilusão, ele avança em saltinhos...). Mas não só... Devido ao atrito, resistência do ar, gravidade, etc, se o balanço fosse impulsionado por um "peteleco", por exemplo, e girasse para um lado e para o outro, lá pela tantas ele acabaria parando. Para isso existe uma mola nele, no Brasil chamado de cabelo, para dar essa "força restaurativa" ao seu movimento de vai e vem. Mas se não existir algo que comprima a mola a cada vibração, para que o movimento de vai e vem continue, o balanço acabaria parando. O escapamento, pois, não apenas conta a passagem do tempo e bloqueia e libera a rodagem, como fornece , através de PETELECOS constantes dados, o seu impulso.
Qual a sacada desse movimento da Zenith. Leiam primeiro o que escreverei, depois sigam para a foto no qual o "regulador" (o "balanço" do relógio, que não é um balanço, mas um complexo desenho em silício) está sendo segurado por uma pinça. Percebam que toda peça ocupa, colocada no relógio, o seu mostrador e é fixada ao centro. O raio extremo da peça, que seria o "pneu" de uma roda de bicicleta, na verdade não é contínuo, mas cortado em três partes (prestem atenção nos cortes... Se alguém quiser me ajudar depois postando uma foto com setinhas, etc, agradeço). De cada uma dessas partes sai uma lâmina bem fininha, perceberam. Guardem a imagem na cabeça...
Imaginem, agora, que estejam com uma carta de baralho entre o indicado e polegar, a comprimindo, mantendo a envergada. Agora, com a outra mão apenas encostem devagarzinho na carta, na parte convexa (imaginação gente! Imaginem aí). Com o mínimo esforço, ela mudará de posição para a parte contrária. Visualizaram?
De volta ao relógio. A função das tais lâminas aí é essa, serem comprimidas ligeiramente para elas próprias, com um mínimo de impulso (lembrem-se do escapamento) conseguirem manter-se vibrando e mantendo a oscilação.
Tá Flávio, mas mesmo a lâmina, ou a carta de baralho, no seu exemplo, precisam de um peteleco para manter a força restaurativa das vibrações. Pois é...
Percebam, então, na posição às quatro horas do oscilador em silício segurado pela pinça, dois diminutos "chifrezinhos". Esses chifrezinhos são as levées, como num escapamento de âncora, e estão conectados a uma engrenagem, que gira e está conectada à rodagem e à mola principal do relógio (neste caso, ele tem reserva de marcha para 60 horas e o troço vibra a 108 mil batimentos! O El Primo, para comparação, vibra a 36 mil).
Aí...
Unam tudo que falei acima e assistam ao vídeo do troço funcionando. Muito louco...
Qual a vantagem. O isocronismo tende a ser perfeito, ou seja, as oscilações não variam como um balanço varia, afetado o dia inteiro por gravidade, atrito, etc. Todo o escapamento sequer precisa de lubrificação, a não ser a roda de escape. A precisão, também, é aumentada. Em testes, pois o relógio é certificado pelo Observatório de Besançon como cronômetro, a variação é de apenas 0.5 segundos a cada dois dias!
Mas não para por aí... Viram que estranha a caixa? É uma liga nova e um modo completamente novo de moldar alumínio. O alumínio aí é fundido como espuma, sendo que os espaços ocos nessa "espuma" de alumínio são preenchidos com polímeros. É 2.7 vezes mais leve do que titânio e pelo menos 10 por cento mais leve do que carbono.
Em suma, é um grande feito e, utilizado esse tipo de escapamento em relógios menos espalhafatosos, será bem legal (o troço não precisa estar a mostra, pode ser um relógio normal). O material da caixa pode ser usado em modelos bem leves, algo que, por exemplo, é marca registrada da Richard Mille.
Vejam
https://www.hodinkee.com/articles/zenith-defy-lab-oscillator-introducing