O causo aí é o seguinte: gostem ou não, achem bobagem ou não, esse relógio é resultado de muita pesquisa, entre engenharia elementar e materiais, que levou ao resultado magistral do sistema Ring Lock, que permitiu a construção do SD Deep Sea como ele é. O Challenge é um ensaio da mesma tecnologia usada no Deep Sea (ou vice-versa, quem sabe).
É o sistema Ring Lock que permitiu que se pudesse fazer um relógio com a resistência do Deep Sea mas com dimensões "usáveis". Utilizando-se a construção tradicional, dos antigos Sea Dweller, o relógio teria que ter dimensões inaceitáveis. A ciência de relógios resistente a água não é simples e nada é proporcional. Um relógio que resiste a 2.000m não vai resistir a 4.000m simplesmente dobrando suas dimensões. Um dos motivos é a maneira como a pressão age sobre as peças da caixa, em especial a diferença de como a força é aplicada no vidro e fundo comparado com como ela é aplicada na lateral da caixa.
Nesse sistema, o que se vê por fora do relógio é apenas uma casca que não tem que suportar pressão além daquela aplicada pela água sobre ela mesma. Já o interior da caixa, que é o anel Ring Lock propriamente dito, tem que suportar o esmagamento ao intermediar a pressão entre o vidro e o fundo. Esse aro tem que ser muito duro para suportar esse esmagamento, bem mais que o aço. Para ser mais científico, estipulou-se que os materiais aplicáveis à essa finalidade deveria possuir um módulo de elasticidade (ou módulo de Young, mais cientificamente falando, se preferirem) superior a 100.000 MPa e uma resistência a compressão ou flexão superior a 500 MPa. O problema do aço (no caso, o 904L) é que ele até possui módulo de Young superior a 100.000 MPa, quase o dobro na verdade, mas sua resistência à compressão e flexão não atendem ao mínimo exigido para esse sistema.
Um dos materiais ideais para isso seria um material cerâmico ou safira, cujas resistências ultrapassam com folga os limites mínimos necessários. Ocorre que, de acordo com a própria patente, há um pequeno problema: fatalmente o aro tem que possuir um furo, por onde deve passar a tige e isso pode ser um problema nesses materiais. A opção por um metal de alta resistência foi a solução. É usado uma liga de aço inoxidável, da classe dos austeníticos, sem níquel e com alta taxa de nitrogênio. Na publicidade da marca é citado apenas como "nitrogen-alloyed steel", mas é uma liga comercialmente chamada Biodur 108. Sua principal função é resistir à compressão entre o vidro e o fundo. Sua capacidade de resistência à compressão é de 770 MPa.
O vidro e o fundo têm que ter uma alta resistência à flexão, mais importante que a compressão. O vidro, que é de safira, não oferece nenhum desafio técnico, já que é um material ótimo para essa aplicação. Já para tampa de fundo, chegou-se à conclusão de que o titânio seria a melhor opção, com resistência de 1.100 MPa à flexão. O titânio usado é o TA6V grade 5.
Ou seja, o sistema resistente no relógio é o conjunto entre o vidro, o Ring Lock e a tampa do fundo. Tudo isso recebe uma carrure em aço 904L, que é o que se vê por fora do relógio, fixados pelo aro rosqueável que se vê na parte traseira do relógio. Isso elimina inclusive a responsabilidade das juntas de vedação à resistirem aos esforços.
Sem essa tecnologia, não conseguiriam fazer do Deep Sea, um relógio usável, ou mais especificamente, de acordo com a patente, um relógio resistente a 50 MPa de pressão. E mesmo assim, vê-se que esse sistema tem limite no que tange o dimensionamento. O Challenge é a prova disso. É sabido que os benefícios dimensionais desse sistema só aumenta conforme se aumenta a pressão a ser resistida. O que significa que sem essa tecnologia, o Challenge seria totalmente inutilizável. Com esse sistema, ele é bem menor do que poderia ser. O que ainda assim, não sei se é usável ou não. Mas esse é o limite dessa tecnologia e foi conseguido com um produto final, ainda que experimental. É um tremendo "breakthrough", é espetacular. E aliás, não me surpreende que tal feito tenha vindo da Rolex. Só podia ser.
Ainda em outras palavras, a diferença entre o Deep Sea e o Challenge é apenas uma questão de dimensionamento. A tecnologia é exatamente a mesma.
A única coisa que lamento nisso tudo é que tão pouca gente, entre eles, proprietários de SDDS's, tenham ciência da tecnologia e da engenhosidade humana envolvida nesse relógio.
Abraços!
Adriano