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Dúvida técnica no tic-tac

Iniciado por Atalo, 10 Março 2011 às 22:13:46

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Atalo

Amigos,

Estou estudando bastante os movimentos dos relógios, tentando ser bem técnico para entender direito.

E tem uma coisa que fica me aporrinhando. Vamos lá:

Quando falamos de frequencia do relógio, em oscilações por hora, nos referimos aos giros do balanço, certo? E para contar a oscilação é só o movimento de ida ou uma oscilação é o vai e vem?

Cada oscilação (ida) corresponde a um dente da roda de escape, certo?

É correto interpretar que com uma frequencia de 18000 bps temos a passagem de 5 dentes da roda de escape em cada levèe da âncora?

Na contagem dos tic-tacs, podemos dizer que nesse caso são três tics e dois tacs por segundo?


Grande abraço

Átalo

shun

 :o :o :o :o :o

ahhaahah, aguardo os técnicos responderem, fiquei curioso tb!!

flávio

Meia oscilação (só ida, só volta). São batimentos por hora e a rodagem é projetada levando-se em consideração isso. Peguemos o El Primo, com suas 36 mil batidas por hora (fica mais fácil, porque cada hora tem 60 minutos, cada um com 60 segundos). Um hertz é um ciclo por segundo. Como, porém, um ciclo completo do balanço contém duas vibrações (uma para cada lado, e cada uma fazendo um tic, e cada tic avançando um pouco a rodagem), chegamos à conclusão que um relógio vibrando a 36 mil batimentos por hora está a 5 hertz. Mas lembre-se: hertz é a vibração completa! Então, quando você observa um EL Primo, em um segundo, o ponteiro terá dado 10 pulinhos (e a cada pulinho um dente da roda de escape foi liberada). Isso, porém, não quer dizer que a roda de escape tenha que girar em um segundo ou tenha 10 dentes. O que importa é que lá na ponta o cannon esteja girando a cada 12 horas, de modo que o conjunto inteiro é projetado para tal. Há cálculos para isso, mas, sendo bem grosseiro (se alguém quiser dar um exemplo...), se há uma roda com trocentos dentes, a outra deverá ter tanto, com um pivô com tantos dentes, etc.

Em suma, você sabe que o balanço bem projetado teoricamente tem uma frequência natural. No exemplo citado, é de 5 hertz. A partir daí, o projetista irá desenhar um jogo de rodas que, chegando lá na ponta, nos ponteiros, os façam giram uma vez a cada 12 horas. Como será o "meio de campo"? Depende...Se o projetista não arruma espaço em determinado lugar, pode colocar uma roda de escape com 50 dentes, mas a próxima roda, por conta disso, deverá ter, sei lá, 150 (exemplo chutado, só para entender o princípio, pois para fazer os cálculos, teria que consultar fórmulas). Mas se ele fizer a primeira com 10, o meio de campo vai ter outro número.

Ou seja, partindo de uma frequência teórica que você sabe que é a certa, você projeta um conjunto de engrenagens que, conectado, deverá girar de modo que, na ponta, a demonstração das horas saia correta. Quantos dentes haverá em cada roda? Depende...Depende de quantos dentes tem a primeira que colocou no projeto e, não só, quantos dentes tem seu pivô! Tudo está conectado.

Entendeu pelo menos o princípio? Há dois bons livros que tratam dos cálculos de rodagem: o Watchmaking do Daniels e o The Theory of Horology de vários autores.


Flávio

flávio

Descobri um modo de explicar melhor, com algo que todo mundo conhece, a bicicleta.
O que importa num relógio são as relações entre cada engrenagem. Por exemplo: a roda de centro gira (deve girar) uma vez por hora; a quarta roda, 60 vezes a cada hora, e assim por diante. Existe, pois, entre a roda de centro e quarta, uma relação de 60 para 1. Isso tem que existir. Mas como você fará isso? Depende de quantos dentes e engrenagens tem.

Numa bicicleta com marchas, imagine que suas pernas são o balanço. Elas completarão um ciclo a cada segundo. Os ponteiros correspondem ao tanto que você anda, e também deve ser fixo, digamos, 100 metros. É possível você girar as pernas uma vez por segundo, com um coroão e catraquinha do meio, e chegar ao final dos 100 metros no mesmo tempo, usando outra marcha, digamos, coroa do meio (menor), mas com uma catraquinha menor ainda. Você gira na mesma velocidade o pé de vela (uma vez por segundo), alcança a mesma distância no mesmo tempo, mas usando relações de marchas completamente diferentes!

O que importa, pois, são as relações entre as engrenagens. Não há como dizer, por exemplo, que num relógio de 36 mil batimentos a roda de escape tem tantos dentes, a do centro tantos, etc. Se falar quantos dentes tem a primeira, dá para saber quanto DEVERÁ ter a seguinte, porque existe uma relação entre elas. Quantos dentes na roda e quantos nos pivôs? Não há regra, depende do projeto.

Volto a dizer: para mim basta saber isso, o princípio, mas se alguém quiser posto algum exemplo real com fórmulas retirado de livro. Aliás, a fórmula é padrão. O que não é padrão é o número de dentes em cada roda.


Flávio

Atalo

Oi Flávio,
Eu vinha raciocinando com um movimento mais lento, de 18000 bps, mas vc foi lo no El Primo (parece que vc tem uma especial predileção por ele, e évo concordar, ouvir um movimento daqueles é um espetáculo).
Aí, se temos 36000 bps, são dez idas e vindas do balanço por segundo. E consequentemente as as mesmas dez idas e vindas da âncora. Se cada uma representa o movimento de um dente da roda de escape, e normalmente esta roda tem quinze dentes, isso representa então uma volta da roda de escape a cada segundo e meio.
Estou certo em imaginar que a partir daí, e calculando uma a uma - pinhão e roda, dá pra chegar no numero de dentes de todas as rodas até a roda do centro?
De qualquer modo, vou procurar um dos livros que vc citou, mas parece que por aqui não encontro nenhum deles com facilidade, não é?
Átalo

flávio

Citação de: Atalo online 10 Março 2011 às 22:59:36
Oi Flávio,
Eu vinha raciocinando com um movimento mais lento, de 18000 bps, mas vc foi lo no El Primo (parece que vc tem uma especial predileção por ele, e évo concordar, ouvir um movimento daqueles é um espetáculo).
Aí, se temos 36000 bps, são dez idas e vindas do balanço por segundo. E consequentemente as as mesmas dez idas e vindas da âncora. Se cada uma representa o movimento de um dente da roda de escape, e normalmente esta roda tem quinze dentes, isso representa então uma volta da roda de escape a cada segundo e meio.
Estou certo em imaginar que a partir daí, e calculando uma a uma - pinhão e roda, dá pra chegar no numero de dentes de todas as rodas até a roda do centro?
De qualquer modo, vou procurar um dos livros que vc citou, mas parece que por aqui não encontro nenhum deles com facilidade, não é?
Átalo



Perfeito, é isso! Me dê uns 10 minutos que vou fazer uma tradução livre do Daniels aqui usando justamente uma roda de 15 dentes e 18 mil. Peraí.


Flávio

Atalo

Eu até que entendo razoavelmente o desenvolvimento mecânico, com jeito, até consigo calcular isso.
Na verdade, a dúvida maior era quanto ao que se considera como uma oscilação completa. Aí estava o meu engano, eu vinha raciocinando com a proporção de uma volta = uma oscilação. Agora ficou claro. E com a sua tradução da Bíblia do Daniels, melhor ainda.
Obrigado mais uma vez.
Átalo


MVasconcelos

"O Ministério da Saúde adverte, consulte regularmente seu Horologista."

flávio

" A roda central gira uma vez por hora e contém o ponteiro de minutos. A razão entre a roda central e a quarta é de 60 para um, então, a quarta conterá o ponteiro de segundos. O número de giros do tambor e da roda de escape para cada giro da roda de centro é uma questão de projeto. O arranjo é mostrado na figura abaixo (nota minha: a figura apenas mostra a ordem das rodas no relógio, aquele desenho padrão).

Para calcular a razão total da rodagem, basta multiplicar juntamente as razões das correspondentes rodas e pinhões. Um exemplo normal seria: roda de centro com 80 dentes, engrenada com o terceiro pinhão com 10 dentes, terceira roda com 75 dentes girando o guarto pinhão com 10 e a quarta roda com 80, engrenada no pinhão da roda de escapamento com 8. As razões individuais serão de 8:1, 7.5:1 e 10:1, dando uma razção total de 600 voltas do pinhão da roda de escape para cada giro da roda de centro, como na seguinte equação: (está descrita, eu escrevo)

80 dividido por 10 vezes 75 dividido por 10 vezes 80 dividido por 8 é igual a 600

A razão de giros do pinhão central e giros do tambor serão consideradas depois. Já que o pinhão central gira uma vez por hora, ele vai girar 24 vezes no dia. O pinhão central suporta o maior torque e, portanto, deve ser o maior possível na prática, para dar resistência aos dentes (do pinhão, não da roda! Adendo meu. É que no Brasil não há tradução diversa para dentes de roda e de pinhão. Na língua inglesa há: leaves, para pinhões, dentes, para rodas. Então, aqui, fiquem espertos). 12 dentes devem ser razoáveis e uma razão de 8 para um resultará em 96 dentes. Parece que 96 e 12 correspondem a uma razão excelente e dão uma excelente transmissão de força. Os diâmetros das rodas devem ser considerados, levando-se em conta o resto da rodagem, em relação ao espaço disponível.

A razão entre a quarta roda e o pinhão da roda de escapamento vai depender do número de dentes da roda de escape o que, por sua vez, pode ser influenciado pelo número de vibrações por hora do balanço. Se considerarmos o arranjo convencional de 15 dentes na roda de escape (nota minha. Vejam que ele usa o termo convencional! Isso não quer dizer, porém, que você não possa brincar com o número de dentes da roda. Claro, irá influenciar todas, sacou? Eu, por exemplo, não sei se a roda do El Primo tem 30 dentes...) para 18 mil vibrações por hora, teremos:

18000 divididos por (60 vezes 30) é igual a 10 voltas do pinhão da roda de escape, onde 60 é a relação entre a roda central e a quarta e os 15 dentes da roda de escape estão dobrados, porque cada DENTE REPRESENTA UMA OSCILAÇÃO, OU DUAS VIBRAÇÕES DO BALANÇO (os grifos são meus e volto ao exemplo acima. Sempre cada meia oscilação corresponderá a liberação de um dente, mas quantos dentes existem, depende do projeto).

A razão total, excluindo o tambor, que não afeta a marcação do tempo, é a seguinte:


8:1 X 7.5:1 X 10:1 X 30 = 18000 vibrações"


Fonte: Watchmaking, George Daniels.



Sacou?


Flávio




Atalo

Valeu Flávio!
Muito obrigado.
Agora, vou fazer a contagem dos dentes da rodagem de um movimento Mondaine que desmontei recentemente, é de 18000 bps.
Grande abraço.
Átalo

A propósito, preciso ir no Derly um dia desses, vou perguntar a ele sobre a roda de escape do El Primero.

flávio

Citação de: Atalo online 10 Março 2011 às 23:38:09
Valeu Flávio!
Muito obrigado.
Agora, vou fazer a contagem dos dentes da rodagem de um movimento Mondaine que desmontei recentemente, é de 18000 bps.
Grande abraço.
Átalo

A propósito, preciso ir no Derly um dia desses, vou perguntar a ele sobre a roda de escape do El Primero.



Conte os dentes da roda, mas não esqueça também os dentes dos pinhões das rodas. Depois poste o resultado aqui. Digo isso porque ao final perguntei "sacou"?, mas eu mesmo não "saquei"  :-X  nenhuma!  ;D

Mentira, como te disse, sei os princípios que regem o troço, onde procurar, etc, mas fazer contas não é comigo! hahaha


Flávio