Adriano, além de apaixonado por relógios, sou apaixonado pelas histórias de como cada colecionador chegou na sua coleção. Queria muito, um dia desses, ouvir/ler qual foi o processo entre esse Adriano de 2019 que abominava as homages e o Adriano de 2022, que entende que tecnicamente são de excelente qualidade! Um dia você conta pra gente?
Por favor observe que é 100% curiosidade, não tem crítica ou mesmo opinião velada nenhuma aqui.
Abraço
Eu sou adepto de que toda convicção é burra. Por isso eu não sou convicto de absolutamente nada, sobre assunto nenhum e naturalmente o processo de mudança de opinião (algo que acho inerente da inteligência, de um cérebro funcional, e não uma fraqueza como reza a mentalidade popular) é parte fundamental desse pensamento.
Dito isso, contudo, sou honesto em dizer que eu não me lembro de alguma vez ter expressado abominação por homages. E deixo bem claro que não estou sendo cínico. Pode até ser que eu tenha dito algo mas eu realmente não me lembro de alguma vez, em canal algum (fórum, instagram, youtube...) ter abominado homages. Caso tenha algum registro disso, gostaria de ver até para poder rebater melhor a minha mudança de opinião, se é que houve.
Até porque se eu disse isso, fui bem idiota, porque lá nos tempos do fórum amarelinho eu já elogiava o Orient Sub, peço preço, pela qualidade, e por ser o mais parecido que se podia ter de um Rolex, sem que fosse uma falsificação. Inclusive o assunto homage vs. falsificação foi discutido incontáveis vezes com diferentes opiniões entre membros.
E digo isso também porque muita gente presume muita coisa sobre mim e passaram a fazer ainda mais após o Youtube. Já perdi a conta de quantas afirmações já me atribuiram e que eu nunca disse. Metade me vê falando de Seiko e presume que odeio relógios suíços. Outra metade me vê apontando algo negativo em um Seiko e presumem que odeio relógios japoneses. Outros presumem que odeio tal coisa só porque nunca falei sobre. Ou presumem que eu tenha uma coleção enorme, cara e interessantíssima.
Mas de todo modo, respondendo objetivamente, é algo bem simples. O que eu me lembro sim é de no passado não ver homages que valessem a pena. Tal como hoje, muitos saem das mesmas fábricas que fazem ou faziam falsificações e a qualidade era tão ruim quanto. Não valiam a pena por dinheiro nenhum, salvo os de marcas reputadas, como o caso do Orient Sub. De resto, não existiam ou existiam bem poucas marcas propriamente especializadas em homages. E o que havia era muito ruim, tipo Parnis. E as máquinas chinesas eram medonhas em todos os sentidos.
O que mudou? Em números grosseiros, de 2010 para cá os relógios originais ficaram muito caros, todos eles. Os bons de verdade ficaram caríssimos, e os baratos de qualidade aceitável (categoria na qual incluia a maioria dos Seiko) ficaram com a mesma qualidade mas triplicaram de preço - no mínimo - tornando-se caros.
Ao mesmo tempo, os relógios chineses melhoraram muito de qualidade, incluindo as falsificações, e de quebra, os homages. Os mecanismos hoje são muito bons (vide os clones de 2824 como PT5000, Hangzhou, etc), por vezes sem dever nada a clones de ETA de outras origens, inclusive suíços. O resultado é matemática: o abismo de preço se manteve ou até aumentou, enquanto o abismo de qualidade diminuiu muito. Um homage de 10 ou mais anos atrás que não valia a pena por dinheiro nenhum, porque iria se desmanchar em pouco tempo, hoje parece uma opção viável e honesta em termos de qualidade, frequentemente surpreendendo.
Para minha realidade pessoal, essas marcas chinesas boas preencheram uma lacuna onde relógios que eu antigamente almejava tornaram-se não só totalmente inalcançáveis como me obrigou a me desfazer de todos eles, sem eu ter que abrir mão de usar um relógio com um mínimo de qualidade para os meus critérios. O fato de serem cópias nunca me incomodou e eu me sentiria hipócrita vomitando virtude em público ao criticar isso (como muita gente faz, mas deve desejar ou até ter homages escondidos), enquanto cansei de usar meu Orient Sub e enquanto cansei de ver marcas reputadas copiarem descaradamente o desenho de outras sem que ninguém fizesse uma só crítica.
Não nego, ainda, que no meu subconsciente não possa ter sido escrito ao longo do tempo algum sentimento de rebeldia, frente às constantes decepções com a indústria, que parece ter se especializado em chutar o saco de seus consumidores. Ou apenas eu tenha ficado mais maduro e menos emocionado com relação à isso.
Para finalizar: por que esse fenômeno de qualidade ocorreu? Meu PALPITE é que foi justamente a enorme transferência de know-how relojoeiro ocorrida da Suíça para a Ásia, em especial para a China, nos anos 2000, quando muitas marcas, especialmente de entrada, resolveram ficar no limite da regra do "Swiss Made", fabricando tudo que fosse possível nesses lugares. Levaram ferramental, técnicos e know-how, e passaram a fazer caixa, bracelete, mostrador, ponteiros, vidros e tudo mais que você imaginar. Não só de relógios miseráveis, mas agora de relógios Swiss Made de mais (ou bem mais) de USD 1000. O resultado está aí. Bracelete, caixa, mostrador e ponteiros de San Martin mais bem feitos e mais bem acabados que alguns relógios suíços de mais de mil doletas.
Não quero que ninguém confie ou acredite em mim. Mas que cada um tire suas conclusões, se tiverem interesse e puderem ter contato com esses relógios. Despido de preconceitos e emoções fica ainda mais claro notar o que estou falando.
Abs.,
Adriano