Nenhum país nasce por combustão espontânea. Gerações vieram antes e são diretamente responsáveis por vários dos processos que atualmente as nações vivem.
Não se pode entender história como compartimentos que não se ligam e, pior, que não têm ascendência sobre os que se sucedem.
Dias atrás, os armênios lembravam seus mortos em 1915. As gerações atuais da Turquia nada têm a ver com a matança, mas passam a ter responsabilidade quando a negam, quando deixam de reconhecer que houve um genocídio.
Para entender o Oriente Médio hoje, é necessário voltar no tempo e estudar as fronteiras artificiais que o Império Britânico estabeleceu, conforme suas conveniências. Parte do que acontece atualmente é resultado de erros cometidos há mais de 100 anos.
Antes do surto colonialista, a África tinha mais de 10 mil nações, de diferentes etnias. Os europeus chegaram, retalharam o continente como a um boi e cada um estabeleceu limites para as nações que criaram conforme seus interesses. Naquele novo território, então, passaram a conviver inimigos figadais, que por séculos se mataram. O que houve em Ruanda foi exatamente isso.
E Portugal, o que tem a ver com o Brasil? Tudo. Certo que seria estupidez e cinismo colocar todas as culpas na colonização, que durou até um certo momento. A partir de outro, o Brasil se tornou responsável por si mesmo. E se não alterou o que estava errado, não o fez por conveniência, desinteresse, leniência e indolência. Essa é a nossa culpa.
Tudo isso, porém, está documentado. As estruturas de poder, de governo, que hoje existem no Brasil são as mesmas, como os mesmos princípios, de 400 anos atrás. Raymundo Faoro trata disso em "Os donos do poder".
O formato da sociedade brasileira, com a evolução necessária para o século 21, pouco difere daquela surgida logo a seguir à Abolição. Sérgio Buarque de Hollanda registrou isso em "Raízes do Brasil". Mesmo tendo sido escrito na década de 1930, está atualíssimo.
E as relações humanas no Brasil, com seus sistemas de convivência social, foi bem definida em "Casa grande e senzala". Gilberto Freyre pode até ser muito contestado por ter pertencido à elite pernambucana, mas ainda não surgiu um historiador de peso para desmenti-lo ou negá-lo.
Culpar Portugal por todos os males ou dizer que o pior do Brasil é o brasileiro não ajuda muito a compreender nossa situação atual. Somente infantiliza uma discussão num país politica e socialmente infantil.
Dic